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Como fazer uma publicidade sutil do seu trabalho

Tenho um cliente que sempre me envia projetos bem específicos: o maior cliente deles é uma empresa mundial de bebidas que precisa da tradução de informações sobre produtos e eventos do inglês para o português, além de casos sobre violação de direitos de marca de português para inglês. Em outras palavras, traduzo para o português muitos formulários de autorização de uso de imagem, assim como regras de participação e outros regulamentos relacionados aos eventos patrocinados. Para o inglês, traduzo o que a equipe regional da empresa (principalmente localizada em Portugal) descobriu sobre outras empresas menores que estão vendendo produtos muito semelhantes, em nome ou imagem, e que constituem infração aos direitos da empresa mundial de bebidas.

Por que estou contando tudo isso? Porque o meu cliente começou a receber artigos mais “artísticos”, sobretudo a respeito de pintura e teatro, e me enviou o material para tradução de português para inglês. Gosto muito desse tipo de trabalho, que tem a ver com o que já faço para outros clientes, e acabo aprendendo mais sobre cultura, história e o contexto político-social do que é tratado nesses textos. É uma mudança bem-vinda em meio a trabalhos mais técnicos.

Recentemente, traduzi para esse cliente uma conversa entre dois escritores portugueses que admiram muito uma diretora e atriz de teatro que adaptou, entre outros textos, os livros de sua autoria. Trabalho concluído e entregue, o cliente me pede para esclarecer uma frase em particular. Copio o que tinha traduzido para ele poder identificar a passagem, já que ele não fala português. O cliente então explica que outro tradutor está traduzindo o mesmo material para alemão e teve dificuldade para compreender não só aquela frase, mas o texto como um todo. “Está muito confuso, desconexo, pela metade”, o cliente disse, usando as palavras do tradutor de alemão. A primeira coisa que perguntei foi: “O seu tradutor está mais acostumado com textos do Brasil? Talvez o motivo da estranheza seja esse…”. Passei a explicar então por que tive facilidade em trabalhar com o material e mencionei outros projetos parecidos dos quais participei.

O cliente ficou espantado com a minha experiência nessa área mais “criativa”, que também inclui a legendagem de vários programas de tevê que falam de turismo e, inevitavelmente, passam pelas artes plásticas e literatura dos países destacados (principalmente Portugal e Itália, pela demanda atual dos meus clientes). Afinal, o cliente me via mais como uma “tradutora técnica”, tendo eu concluído a localização de websites e aplicativos, além daquele contexto mais empresarial da empresa mundial de bebidas. Percebendo essa deixa, mencionei que também traduzo do espanhol e do italiano para português e inglês. Apesar de eles terem uma cópia do meu currículo e o link para meu site profissional e alguns perfis online, não devem ter tempo nem oportunidade para ficar consultando tudo e guardar na memória exatamente o que é que eu faço todo santo dia.

Assim sendo, com uma simples troca de e-mails com um cliente com quem já trabalho há alguns anos, pude fazer uma publicidade sutil do que posso oferecer para ajudá-lo mais frequentemente. Digo que é algo sutil porque é preciso identificar o momento ideal para compartilhar suas experiências com os clientes atuais. Não dá para ir com sede ao pote e despejar mais de duas décadas de experiência sobre a cabeça de um cliente. Isso poderia dar a sensação de que ele está se afogando em detalhes e quase nada seria retido na memória.

Esse cliente é bastante cordial e sempre pergunta sobre o clima aqui em San Diego, já que ele geralmente está “enterrado” em neve durante meses e meses na Europa, conta de qual país está escrevendo porque viaja bastante a trabalho, sabe que eu tenho filhos e pergunta como estão (uma vez eu disse que não poderia abrir uma exceção e trabalhar no fim de semana, nem que quisesse, pois estaríamos fora durante um campeonato de futebol da minha filha em uma cidade próxima). Ou seja, fomos evoluindo desse tipo de cordialidades, o que não constitui uma amizade íntima, mas criou uma abertura que vai trazer resultados profissionais bastante concretos, porém sem fazer com que eu pareça uma desesperada que está em busca de projetos a todo momento e com medo dos períodos de vacas magras.

Esse tipo de comunicação, de troca de experiências, acaba sendo bastante orgânica e coloca prestadores de serviços, como nós, tradutores e intérpretes, na posição de solucionadores de problemas. Quando o cliente precisar de mais alguma coisa relacionada à tradução, vai se lembrar de mim. Só sei que a conversa terminou com um: “Ah, você também traduz do italiano? Como é que nunca me dei conta disso, ainda mais com um nome como o seu!”. Ou seja, nunca mais ele vai se esquecer do que eu posso oferecer.

 

Sobre a autora

Rafa Lombardino é tradutora e jornalista brasileira e vive na Califórnia desde 2002. É a autora de Tools and Technology in Translation ― The Profile of Beginning Language Professionals in the Digital Age, baseado na aula que ministra no curso de extensão da Universidade da Califórnia em San Diego. Rafa trabalha como tradutora desde 1997 e, em 2011, começou a colaborar com pequenas editoras e escritores autopublicados para traduzir livros para português e inglês. Além de dirigir a Word Awareness, uma pequena rede de tradutores profissionais, Rafa também apresenta o podcast Translation Confessional. Para receber mais dicas de produtividade, acesse o canal da autora no YouTube.

 

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