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Eu sou Abrates: Sthefani Techera

 

Quem é você e o que você faz?

Apesar das palavras serem uma peça-chave do nosso trabalho, quando se trata de escolher as palavras para me apresentar, tudo relativo à minha profissão ocupa um lugar central. O que eu faço determina, em boa medida, quem eu sou. Dito assim, muitos poderiam pensar: “que triste deve ser a sua vida”. Porém, eu realmente me sinto realizada, não apenas em termos profissionais. É muito mais do que isso.

Eu sou gaúcha de nascimento, mas de família uruguaia e residente em Montevidéu, Uruguai. Há 27 anos, minha mãe tomou a decisão de viajar pouco mais de 20 km para o pré-natal e para o meu nascimento. Aquela decisão inocente acabou me tornando a pessoa que sou hoje em dia.

Lembram daquela frase “Do Oiapoque ao Chuí”? Eu fui criada no ponto mais ao sul do Brasil, na fronteira com o Uruguai, com meu coração dividido, em uma cidade pequena e pluricultural. Não falamos somente português e espanhol. Também há muitos imigrantes de países árabes e asiáticos, sendo nada incomum entrar em uma loja ou supermercado e ouvir conversas em diferentes idiomas, pessoas com roupas e costumes diversos vivendo em total harmonia e com respeito pelo relativismo cultural.

Acredito que essas experiências da minha infância e adolescência despertaram a minha curiosidade e a minha sede constante por aprender mais a cada dia, o que serve muito bem à minha profissão. Sem deixar de mencionar que ser tradutora e intérprete satisfaz de forma excelsa a minha curiosidade. Em ocasiões, fico sabendo de coisas que talvez preferiria nem saber.

Sempre fui uma menina e uma mulher de muitos sonhos. Eu adoro sonhar, mas o que eu gosto ainda mais é alcançar aqueles sonhos. Mergulhar no mundo da tradução permite uma versatilidade enorme nesse sentido. Há muito a ser explorado ainda, e isso me parece motivador. Eu costumo dizer que trabalho para viajar. Viajo quando estou apreciando o céu através da janela do avião e viajo também quando estou olhando para o palco através do vidro da cabine. Viajo através da tela do computador.

Milhares de palavras foram traduzidas em vagões de trens na Europa e nos Estados Unidos. Milhares de cidades, causos e histórias de vida chegaram a mim em forma de textos e por meio dos fones de ouvido. Isso é o que eu faço: desfrutar do lugar em que a vida me colocou e aproveitar as escolhas que eu fiz.

 

Como você chegou à tradução e como foi seu início?

Como eu já comentei, nasci e cresci em um ambiente diverso em termos linguísticos e culturais. No Uruguai há uma frase muito frequente, de que gosto muito, que diz o seguinte: “Con el diario del lunes…” e faz alusão a como é mais fácil entender as coisas logo após os acontecimentos. Portanto, hoje eu poderia dizer que me tornar tradutora e intérprete parecia ser meu único caminho, e também o caminho mais natural para mim.

No entanto, quando fiz 14 anos e comecei a pensar no que iria estudar, eu não fazia a menor ideia de que existisse tal coisa. Sendo falante nativa de português e espanhol, estudante de inglês desde os 4 anos e sempre querendo aprender novas línguas, decidi que queria fazer algo nesse sentido. Um belo dia abri o computador e, após pesquisar, descobri dois mundos muito cativantes: diplomacia e tradução. Na minha mente, campos de estudo irmanados, complementares. A combinação perfeita.

Foi assim que começou uma jornada de 4 anos em que simultaneamente cursei duas graduações: relações internacionais e tradução. Logo veio o mestrado, meu primeiro trabalho, o trabalho autônomo, cursos de especialização, muita dedicação e muito foco.

De qualquer modo, desde a época de faculdade, soube que minha verdadeira vocação era a interpretação. O grande divisor de águas chegou em 2018, quando fui ao Rio de Janeiro para participar do 9° Congresso da Abrates. Aquele sábado, 16 de junho, foi a primeira vez que eu entrei em uma cabine de interpretação. Eu havia me inscrito como voluntária e tive a honra de interpretar uma palestra do mestre Ulisses Wehby de Carvalho para o espanhol. Mal sabia eu do desafio que teria pela frente quando abri o meu microfone, mas a adrenalina daquele momento e o feedback que recebi de um grande intérprete profissional foi tudo o que eu precisava. Assim, começou mais uma etapa da minha caminhada, que ainda está longe de terminar.

 

 Para você, qual é o aspecto mais incrível da sua área de atuação?

A capacidade de me nutrir de novos conhecimentos todos os dias me parece uma qualidade verdadeiramente incrível da tradução. Minha profissão não apenas me permite viver bem e pagar as contas, também me mantém informada, atualizada com as últimas tendências, conectada, empolgada e inspirada.

Informada, porque não tem dia que eu não aprenda algo novo. Pode ser um novo termo ou pode ser conhecimento geral que, com certeza, será útil em algum outro momento. Atualizada com as últimas tendências, porque em mais de uma ocasião me sentei para assistir ao jornal da noite, e ouvi o relato de uma notícia que, na verdade, eu já sabia, pois de manhã cedo havia interpretado um evento em que o orador, do outro lado do mundo, comentara a respeito do assunto. Conectada, porque a comunidade de profissionais da tradução é uma comunidade global, muito colaborativa, que desde o início me recebeu de braços abertos. Sempre conheço novos colegas, com quem posso compartilhar experiências, colegas cujas histórias, esforços e conquistas me inspiram, me empurram a continuar avançando.

Ser empreendedora e trabalhadora autônoma na indústria da tradução neste mundo globalizado me oferece recursos e possibilidades que eu nunca teria pensado. Tenho aceitado desafios e superado obstáculos que eu jamais teria imaginado. Por acaso, isso não é incrível?

 

E o aspecto mais desafiador?

Muitas características tornam essa área de atuação incrível e fazem com que seja, ao mesmo tempo, muito desafiadora. No entanto, com dedicação, esses desafios são geralmente fáceis de superar.

Por outro lado, penso que o principal desafio seja combater a desinformação. “Precisamos educar o cliente” tem se tornado quase que uma frase feita entre tradutores e intérpretes. Essa é uma realidade um tanto triste para a nossa profissão. Eventos recentes em várias partes do mundo que promoviam a tradução como um bico, como uma saída laboral em meio à pandemia para quem tem conhecimento de duas línguas ou mais, colocaram em evidência a natureza preocupante dessa falta de informação.

Em épocas de avanços tecnológicos e de inteligência artificial, é mais urgente do que nunca valorizar a nossa profissão e dar sustento ao nosso trabalho. Consequentemente, é igualmente fundamental fortalecer a comunidade de tradutores e intérpretes e as associações que nos representam. 

 

Cite um mito e uma verdade sobre sua área de atuação que você só descobriu na prática.

Ser tradutor ou intérprete não é sinônimo de ser um dicionário ambulante. Creio que esse foi o primeiro mito que desabou frente aos meus olhos, inclusive na época de faculdade. Atualmente, vejo até memes em relação ao tema. Mas é muito comum as pessoas, em atitude inquisitiva, questionarem como se diz tal ou qual palavra em uma língua estrangeira e, ainda por cima, cobrar com um gesto ou um comentário repressor quando você responde que depende do contexto ou que, simplesmente, não sabe. Nós não somos dicionários ambulantes. Não há nada de errado com isso. Somos tradutores. Somos ótimos, pesquisando. Essa é uma habilidade imprescindível, acredito, para um tradutor bem-sucedido.

Quanto às verdades, devo me abster de responder, pois eu era completamente ignorante da área e precisei tirar o véu de mistério aos poucos. De fato, acredito que ainda tenho muito por descobrir, muito para experimentar e conhecer.

Costumo dizer que, como pessoas, somos um processo. Estamos o tempo todo em construção. Se eu fosse um site, provavelmente exibiria uma daquelas notificações de “em construção”. Isso não é diferente, no meu caso, como profissional da área da tradução. É uma área muito dinâmica. O que ontem era feito de uma forma, amanhã pode ser otimizado e feito de outra. A língua está viva, como dizia Saussure. O que ontem era dito de um modo, amanhã poderá ser expressado de outro. E assim por diante. 

 

Qual dica construtiva você dá para quem possa estar cogitando seguir na sua área de atuação ou para quem possa estar começando?

Estudo, preparação, prática. Essa é a dica mais importante que eu posso dar para quem estiver cogitando entrar para a indústria da tradução. Embora qualquer área do conhecimento precise de estudo, preparação e prática, tanto a tradução quanto a interpretação podem ser tarefas extremamente desafiadoras na falta desses ingredientes fundamentais.

Eu diria que o primeiro passo é descobrir se é disso que você gosta e se é nisso que você quer investir seu tempo e seu esforço. Assim sendo, para evitar frustrações desnecessárias e pedras no meio do caminho que podem fazer com que você acabe desistindo de alcançar seus objetivos, o melhor a fazer é se preparar.

Finalmente, é muito importante ter iniciativa e uma atitude proativa. Há trabalho suficiente para todos. Estou convencida disso. Os gestos colaborativos que costumo ver e os maravilhosos colegas com quem compartilho projetos regularmente são prova disso. Mas, se você estiver cogitando atuar como tradutor, saiba que será necessário correr atrás, como dizemos popularmente. Cada um se destaca à sua maneira. Descubra qual é o seu valor agregado e qual é a melhor forma de comunicar e colocar isso no mercado.

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Sthefani Techera é tradutora e Intérprete nas áreas de comércio exterior, direito, diplomacia, relações internacionais, tecnologia e software.

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